quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

Lembranças de Natais que Passaram

O Presépio de Minha Infância



Sempre que chega essa época do ano e me deparo com a grande variedade de enfeites natalinos, um entre todos eles ainda me causa estranhamento e meu comportamento diante dessas figuras estáticas bem arrumadas em algumas lojas da cidade é parecido ao de uma pessoa que presencia um delito mais não quer ser notada.
As peças arrumadas naquele cenário que conhecemos como presépio ou lapinha sempre foi algo proibido em toda a minha vida por fazer parte de uma família que mudara de religião e que de uma hora para outra aquilo se tornou proibido. A novidade na cabeça de uma criança de cinco anos mal explicada e simplesmente imposta tem o efeito parecido ao de uma dor de garganta seguida de um resfriado depois que você tomou algo gelado para aliviar o calor e matar a sede. Alguém chega e diz: Vocên não pode beber gelado porque isso te “faz mal”; é proibido.
Na casa de nenhum familiar meu teve presépio e também não me lembro de árvore e outros adereços, mas uma lembrança dessa época que nunca me abandonou é a de uma vizinha de minha avó materna, dona Maria de Tal, viúva, mãe de uma filha solteirona que na sala de sua casa, junto à porta armava um verdadeiro canteiro de obra e ali arrumava todos os anos aquele cenário que eu e minha prima Neide só víamos depois de pronto. Nossa tentativa de ver pelo buraco da fechadura o momento em que ela estava construindo a lapinha, como dizíamos, era reprimido severamente por essa senhora que nos reprimia com ameaças de contar para nossas mães.




Para ganhar um dinheiro extra essa senhora vendia picolé caseiro, que nós conhecemos como flau; o lugar dessas lembranças é Vitória de Santo Antão, interior de Pernambuco e lá o suco congelado em saquinho plástico se chama picolé. Lembro também que a mesma gostava de fumar cachimbo e que sua casa tinha um cheiro forte de naftalina e a noite, quando ela sentava numa cadeira de balanço de palhinha para ver TV, a naftalina encontrava-se com fumo barato depositado no cachimbo.
Quando a lapinha ficava pronta aparecíamos quase que diariamente para importuná-la querendo ver aqueles bonecos ali arrumados que chamávamos de ‘bringuedos’. Quando o natal passava, o cenário desaparecia da mesma forma que fora montado envolvido em mistério, longe dos olhos de crianças curiosas e cheias de perguntas.
Diferente da árvore tímida que monto em casa ainda encontrando objeções familiares, o presépio continua sendo para mim uma peça proibida vê-lo em locais público ainda tem a mesma conotação de minha infância de algo que só poderia ser visto com a presença de sua proprietária sempre ali ao nosso lado dando respostas curtas e nos alertando o tempo todo que não podíamos tocar em nada. Era como se aquela casa cheirando a fumo barato e naftalina fosse um museu e aquela vizinha asquerosa a nossa guia.

# A primera imagem faz parte do blog fenixdealagoas.blog, de Maria do Rosário

Nenhum comentário:

Postar um comentário