sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

Parabéns JESUS por mais um Aniversário

Jesus é meu HEROI; meu ÍDOLO; Meu AMIGO INCONDICIONAL, meu Irmão mais velho, apesar de que sempre achei e continuo achando que prá quê serve um irmão? Talvez os outros tenham sempre uma resposta pacificadora, mas nosso currículo familiar não é igual ao de todo mundo. Pois bem, voltando a falar do aniversariante e o seu dia, que não é bem o seu dia e muito menos o mês que também não é o legítimo o certo, aquele cem por cento legal pense colocar isso tudo na cabeça de uma criança como eu fui, criado em um universo onde as falsas aparências sempre tiveram um caráter quase que religioso, onde o que conta é o que os estranhos falam e não aquilo que você vive no dia a dia. É uma decepção atrás da outra. Desde que você põe os pés neste bendito mundo passam a te ensinar as verdades e mentiras que repassaram para eles e depois de certo tempo você vai descobrindo aos poucos que a história não é bem assim. Como assim não é bem assim? O duro é que essa descoberta sempre acontece fora do sagrado seio familiar e ai, quando você volta e questiona a família, dá inicio a uma revolução.

Por falar em família, Jesus também teve a dele: A SAGRADA FAMÍLIA, mas há quem conteste essa versão dizendo que ele só teve primos. Dez! Um garoto que não teve irmãos, apenas primos. Eu consigo sem problema nenhum visualizar a cena: Filho único, mimado e vigiado pela mãe castradora e usado por seu pai, que na verdade não era bem o seu pai legítimo porque o menino não fora concebido de uma relação carnal, podemos dizer um padastro, que se aproveitava da criança para iniciá-lo no oficio de carpintaria. Em tempos de politicamente correto, isso seria chamado de exploração do trabalho infantil e daria cadeia, dependendo do lugar e de quem explorava a criança. A denúncia seria formalizada se houvesse uma equipe de filmagem no local com uma câmera escondida. Ter primos no lugar de irmãos pode ser uma experiência e tanto ou talvez não. Tudo na vida tem o seu lado positivo e negativo, mas saber que um primo vem a sua casa para passar férias e que o mesmo pode acontecer com você é algo fora do comum. Tendo ou não irmãos, disseram certa vez a Jesus: Tua família esta ai fora a tua procura ao que ele falou: Minha família são aqueles que me seguem. Os relatos de sua história, escrita por terceiros nos revelarão ainda passagens semelhantes onde o pouco caso para com a família sagrada ficou registrado.

Criada uma religião, era preciso arrumar o que estava fora do lugar e não fazia sentido continuar aquela narrativa sem que houvesse a normatização dos fatos e o aval da Central que agora passava administrar os registros daquela história. Promulgada como religião oficial do Estado, o que antes era uma história na boca do povo passou a ser normatizada e mais uma vez o interesse de homens considerados “Especiais” ditou que aquela data seria considerado oficial para comemorar um fato que em si não tem data, local e hora exata. Dois mil anos tem se passado desde que este meu AMIGO chamado Jesus nasceu e por todo o Globo, por onde sua história chegou angariou adeptos, fãs, simpatizantes, inimigos, ascetas entre outros. A história ficou dividida em duas; antes e depois dele e quem se põe a conhecer sua trajetória ou se encanta e passa a seguí-lo ou desconfia de que tudo aquilo não passa de histórias criadas por mentes férteis.

Nesses tempos modernos onde os valores sólidos foram trocados por aqueles de papel, em que o ser humano é julgado pelo que tem e os heróis estão ligados ao comércio e ao lucro, Jesus continua sendo o meu Herói. Meu ídolo, aquele a quem posso enviar uma carta ou um e-mail de natal pedindo algo que para mim é impossível.
Hoje é 25 de dezembro o dia que marcaram como data oficial do aniversário do nascimento de Jesus. Fico imaginando em que lugar do mundo ele poderia aparecer para prestigiar sua festa de aniversário. Seria em uma pequena igreja ou numa Catedral? Talvez não. Um centro de convenção acomodaria mais gente. Uma grande praça, um descampado, em uma praia, mas pensando bem acho que seria melhor em um estádio de futebol, caberia mais gente e ainda sobraria uma multidão do lado de fora que seria recompensada com uma cartelazinha com um número que poderia ser premiado. Muitos prêmios foram postos no evento para atrair a multidão ao lugar. Os do primeiro lote eram os mais cobiçados: Carros importados, casas de praia e viagens internacionais.
O mestre teria de escolher um país a cada ano para comemorar seu aniversário. Na vez do Brasil, o melhor lugar seria a cidade do Rio de Janeiro por ter sido corte na época do Império e Capital Federal da República até aparecer o senhor Juscelino Kubitschek e debandar com a sede do governo para o meio do cerrado. Sem contar que dizem ser Deus um brasileiro e o papa João Paulo II considerava-se um carioca. Nesta cidade ele encontraria uma das mais novas maravilhas do mundo, réplica de sua imagem fixada no alto de um morro, de braços abertos vendo o espetáculo daquele lugar até os limites de um bairro chamado Leblon.
Depois do passeio de helicóptero pelas áreas mais belas da cidade, com passagem pela réplica de sua imagem no corcovado a aeronave plana na abertura do maior estádio do Mundo. É o segundo a descer ali trazendo as duas personagens mais importantes para a ocasião. Uma multidão de rivais torcedores religiosos cristãos separados por facções que se intitulam ser a mais correta o aguardam debaixo de um calor insuportável. Por ser dezembro, e mês de DAR e RECEBER presentes, o primeiro helicóptero chegou trazendo um sujeito brasileiro, branco, travestido de papai Noel levando a multidão ao delírio. A aeronave seguinte, além de levantar poeira foi recebida com maior cautela porque passado tanto tempo a imagem do Messias poderia ter mudado e ele envelhecido. Só os fanáticos é que não ficaram em silêncio um só momento.
Sua passagem foi rápida em direção ao camarote destinada as autoridades eclesiásticas, políticos, artistas e a realeza tupiniquim. Como o REI dos Reis, Jesus encontrou ali uma corte de peso. Nunca vira um pais com tamanha aglomeração de “reis” em um só lugar. Era rei pra tudo o que é lado: Rei do futebol, do brega, do gado, do forró, das quentinhas e claro, as rainhas, representadas pela monarca da corte dos baixinhos.
Na hora marcada pelo cerimonial, o Mestre foi levado de volta para o helicóptero já posicionado no gramado e não pode dar uma volta olímpica pelo estádio para receber o aceno dos fiéis que desejavam tirar muitas fotos dele.
O homem de papai Noel ficaria ainda por mais tempo para satisfazer o desejo da massa ali reunida, pois afinal aquele era o seu momento e a época em que ele ganhava um dinheirinho extra levando alegria aos corações das crianças e dos adultos que não deixaram de agir como tal.

Apesar de minha internet ser discada, caindo a todo instante, mandei um e-mail para Jesus. Escolhi um desses cartões da rede cheio de imagens brilhantes e frases comoventes, mas não deixei de frisar bem quem estava lhe enviando aquele cartão de aniversário. Felicitei-o por mais um ano de vida, não importa se a data estava errada, e pedi desculpas por não ter ido a um templo religioso para ver a cerimônia repetida de todo os anos. Não dei nenhuma desculpa esfarrapada como a de que não tinha roupa nova e que por isso fiquei em casa sentado na frente do computador.
Depois das felicitações, agradeci muito por tudo o que foi realidade em minha vida neste ano de 2010. Tanto o que foi positivo quanto o que foi negativo. O presente que ele me deu no meu aniversário e nos anos que já se passaram.
Sem mais palavras, desejei um “Feliz Aniversário” e com um clic enviei, para o meu AMIGO JESUS.

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

AS FORMAS DA CIDADE 1



O que me diz as formas da cidade?
Caminho de um lado para outro neste espaço urbano e a cada esquina uma novidade; mais um prédio se levante onde antes tudo era mato.
Concreto, concreto e o chão fervilha com o ataque do sol que vem ardendo na pele. Cada vez mais precisarei de uma nova camada de protetor solar. Produto caro, mais caro que alimento, triste sina.
Se não comer não ficarei de pé para sair e ver as formas da cidade.
Se encaro o sol sem o protetor, corro o risco de adquirir  uma doença indesejada.


Às vezes o percurso é longo e não dá para ir a pé.
Pego o ônibus que aparenta me trazer algum conforto. Engano.
A caixa andante mais parece um microondas. Os raios do sol penetram no espaço limitado do veículo e mais de cinqüenta pessoas buscam respirar um AR puro como eu. Os cheiros são diversos: Tanto bom quanto ruim.
A condução que estava acelerada foi aos poucos diminuindo e agora tudo está parado. Sentado do lado que faz sol a vontade que dá é invadir o lado da sombra.
Olho para a janela que está aberta, mas o calor reina soberano. Dá vontade de quebrar todo aquele vidro, puxar a trave de segurança, já pensou que confusão?

O trânsito anda, só um pouquinho, de sacanagem e para novamente.
O ônibus que não tem ar refrigerado nem vidro fumê tem um bendito som.
Os aflitos passageiros são obrigados a escutar o repertório de músicas de mau gosto do motorista.
Se bagaceira para ser feia tem de ser grande, um entediado com a seleção do rodoviário decide ligar o som de seu celular e escolhe um rap. Mais à frente, na mesma bancada de cadeiras, uma jovem bem vestida, parecendo recepcionista de eventos também adere à musicalidade de um celular e o som de uma música evangélica entra na disputa do fuzuê musical.
O trânsito sôfrego volta a fluir com maior agilidade. A cabeça gira de um lado para outro, dividindo o olhar com o rosto de quem consigo ver passando na catraca, uma infinidade de barrigas e virilhas que se esfregam em meu ombro.
A janela me revela formas das mais diversas na medida em que a condução avança E o lugar em que vou descer se aproxima.
Fora da caixa andante sigo a pé em busca de algo e me deparo com coisas
Estranhas do cenário urbano. Placas de ferro brotam do chão de um canteiro como se fossem folhas ou fumaça...


Caixas d’água suspensas se assemelham a gigantescos copos postados no céu da cidade, como se uma mão invisível os segurassem no ar para serem visto de longe.
Arranhas céus que se elevam na parte alta da cidade faz gelar quem os ver ao longe. Um emaranhado de torres de transmisão vai aos poucos tomando conta do horizonte plantadas no alto dos edifícios como se fossem árvores do espaço.
Nas formas da cidade, eu procuro entender a linguagem do novo para com o velho, do presente para com o passado!


O que me dizem as formas da cidade?

Os Veranistas da Praça Sinimbu



 O turista que vem a Maceió e do comércio segue em direção a praia da Avenida encontra uma praça ali próximo ao mar chamada Sinimbu. Fundada no começo do século XX, foi durante algum tempo um belo cartão postal da cidade. Com o passar dos anos e várias prefeitos, cada um com o seu gosto de remodelagem pública, a praça perdeu elementos que antes figuravam em seu contexto histórico adquirindo o formato que tem hoje: Um labirinto de árvores encobre caminhos de paralepipedos. Grandes recipientes em formas de bacia fincados no chão sobreviveram às gerações de prefeitos, mas o que neles hoje é plantado em nada lembra o jardim das antigas imagens.
Na medida em que o tempo foi passando a praça foi perdendo os adereços que lhe dava graça e beleza: Ao seu redor, o monumental prédio da Companhia de Bondes que ali funcionava onde hoje está à antiga Reitoria, teve sua fachada totalmente descaracterizada assim como o prédio da Escola de Artes e Ofícios que compõe o mesmo conjunto arquitetônico.
Desapareceram as esculturas fincadas ali em seus primeiros momentos; o obelisco, o coreto que era conhecido pela alcunha de pagode Chinês e que tinha ao seu lado a estátua de Mercúrio, que hoje se encontra no holl da Associação Comercial de Maceió. Até o riacho Salgadinho que corria solto ao lado da praça e passava por baixo da Ponte dos Fonseca, foi desviado e a referida ponte tornou-se um elemento apagado no contexto da cidade. De tudo o que perdeu a praça só não se desfez da estátua de seu homenageado, o Visconde de Sinimbu que até hoje, século XXI, continua lá, imponente com a mão direita dentro da casaca contemplando as arrobas do tempo moderno.


 No período das aulas do Espaço Cultural da antiga reitoria, o movimento de carros e alunos é constante, mas a praça para mim sempre teve aquele ar de insegurança e abandono. Durante o dia, transito por suas imediações sem me preocupar com nada, mas quando escurece não me sinto seguro se por ali estiver. Bem de frente ao alojamento estudantil se encontra uma parada de ônibus que vão para um shopping da capital e nem sempre há a presença de outros passageiros neste ponto o que nos deixa bastante ansioso.
Vez por outra, a caminho do referido shopping, o ônibus em que estou chega à praça e descubro surpreso, não sei por que toda vez este fato me surpreende, que a praça está tomada de gente vinda de fora. São os moradores temporários que chegaram para mais uma estadia ali. Vieram em busca de uma negociação que não será resolvida em dias. São agricultores oriundos dos mais diversos lugares do Estado em busca de novas reivindicações para seus problemas com a terra. São os veranistas da Praça Sinimbu.
Em outra parte deste logradouro se encontra a sede do INCRA e como as negociações não será resolvida da noite para o dia, o mutirão, composto por adultos e crianças acampam sem a maior cerimônia não se intimidando com os transeuntes que trabalham ali perto ou os que estão ali apenas para pegar o ônibus.
Passada uma semana o choque da primeira visão dá lugar a uma tolerância mais do que harmoniosa. Ao longo do ano aquela cena se repetirá quase que a cada três meses, para ser um pouco modesto. As dificuldades da chegada se resolverão com os paliativos existentes no local. As cabanas de plástico escuro terão estrutura de madeira formado de uma mine casa se o impasse demorar a sair. A higiene dos moradores não se configura um problema, pois a municipalidade disponibilizara os banheiros químicos e a água para o banho e o cozimento de alimentos será arranjada no cano de um imóvel fechado. A fumaça de pequenas fogueiras feitas nos espaços vazios para preparar a comida, se expande na praça, por entre as construções toscas do plástico negro onde crianças de tamanhos variados curtem o momento de uma situação que os adultos criaram para elas.

Depois de certo tempo, sem mais transitar por ali, descubro um dia que a praça voltou a ser como antes. Os veranistas foram embora e o espaço que ocupavam ficou assim, vazio, a esmo sem muita utilidade. Os troncos das árvores perderam os varaus de roupa e não mais segura uma frágil cabana. A terra desocupada ficou rasgada como marcas de estrias pelos cortes feitos para escoar a água da chuva e dos pratos lavados. Um tímido galho de planta florido restou ao pé da estátua de Sinimbu que apareceu como num passe de mágica depois que as lonas negras foram retiradas do teto das casas revelando o pedestal e a figura do ilustre alagoano. O banheiro químico, o cheiro, e a alegria daquelas crianças que vieram de longe para uma temporada na capital, desapareceu. A praça voltou a sua monotonia constante. Os garis com muito pouco para limpar, os religiosos e suas costumeiras pregações ao meio dia, os transeuntes que passam de um lado para outro e a minha desconfiança de que ali não é um lugar seguro para ficar depois que escurece.

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

O menino do outro lado da porta

Há um menino do outro lado da porta
Sentado em um banquinho
Esperando ser chamado
Quando o tempo passar de vez para ele
e o sol não mais nascer em seus dias.
Ele aguarda o tempo com paciência
E no banco em que está sentado
Observa pela abertura da porta
A vida conturbada dos adultos.

Há um menino do outro lado da porta
Sentado ao lado de sua lancheira.
Ali, ele guarda todos os seus brinquedos
Um pouco dos que sobraram de sua infância.
Grudados ao seu corpo, ele sabe da existência de cada um:
Cavalos, soldados, carros e uma multidão de sonhos...
Para cada sonho uma história fascinante
Onde ele atou e foi figurante. Morreu e sobreviveu
Nesse filme, ele foi roteirista e diretor.
Ficou triste apenas com o tempo que
apressou a passagem para a idade adulta.

Há um menino do outro lado da porta
que me espera quando estou triste
e não tenho com quem conversar...
Tudo o que ele faz é me ouvir e vez
por outra diz algo, nada além do que opinião
De criança.
Como eu queria voltar a ser aquele menino...
Tomar o lugar dele, possuir sua lancheira
Recheada de sonhos, heróis que nunca morrem
Viver num mundo onde até a morte tem outro
Significado
O olhar do menino sentado naquele banco
É um olhar de saudade, cheio de paz e melancolia.

Há um menino do outro lado da porta
Que me espera para um dia partirmos juntos
E enquanto esse dia não chega, ele sobrevive.
Com os meus dramas. Chora por mim e pelo
Amargo da vida, a falta de amigos, as dores do corpo
Da alma e a solidão da minha existência...
Às vezes ele acena impaciente querendo acabar
Com o meu sofrimento, mas com o tempo a gente
Amadurece e desiste de desistir, o que ele não entende.
Há um menino do outro lado da porta,
Que sou eu.

Alcides B. Santos

Maceió, fevereiro de 2010

O trem de minha infância


O trem de minha infância foi embora
Levado pelo tempo que um dia
o trouxe até aqui.
Mal o dia clareou
e ele passou em nossa porta
com seu apito estridente
acordando quem ainda queria ficar na cama.
Tudo estremecia com a passagem daquele trem.
 Partiu levando lembranças
 de uma infância que não volta mais.

O trem de minha infância partiu
E deixou para trás desenhos de fumaça no ar
Que se juntou as nuvens
desenhando no céu a palavra
Adeus ...
Eu; tão pequeno, em pé na cadeira, na janela,
fiz o mesmo ritual de todos os dias;
acenei  para o trem e os desconhecidos que ele levava
crente de que logo ele voltaria com mais gente
e me despertaria com o seu apito novamente.

O trem de minha infância partiu
Sem que eu soubesse de sua morte decretada.
O tempo passou, esperei pelo trem, esperei, esperei e nada...
Adormeci no sofá da casa de minha avó, junto à porta
Para não perder a passagem do trem quando ele voltasse.
Mas eu estava tão enganado: não sabia que o trem
Foi embora para nunca mais voltar.

O mato tomou conta de tudo e a linha foi aos poucos
Perdendo seu traçado na terra onde antes se deitava.
Hoje, no lugar por onde passava o trem
fizeram casas e ali mora um monte de gente:
Será que eles não têm medo de uma hora dessas
O trem volta?

Maceió, março de 2010,
Alcides B. Santos

MACEIÓ – PORTAS E JANELAS DA CIDADE


O que têm a nos dizer hoje portas e janelas cerradas e carcomidas pelo tempo, entregue ao abandono por causa da mão dupla do progresso? O que sentimos ao avistarmos antigas construções que compõe o cenário da cidade e nos deparamos com portas e janelas com bandeirolas de ferro e madeira, molduradas e caindo aos pedaços, resistindo como podem o passar do tempo à espera de dois destinos? A sorte de uma restauração que lhes trará uma nova vida ou, sua morte, definitiva, que as levará para o esquecimento eterno.
Janelas de antigas construções estão assim sentenciadas a um lento padecer causado pelo abandono e o descaso com os vestígios arquitetônicos de uma época que ficou para trás. Não há um museu de portas e janelas antigas em que poderiam ficar ali guardadas para que as gerações futuras pudessem contemplar a evolução artística de um povo através de seu passado arquitetônico. Espalhadas pela cidade a mercê do tempo e do homem, muitas ainda resistem com o passar dos anos. Esquecidas e desfiguradas, portas e janelas antigas se resumem a uma marca na parede no alto de uma loja, drogaria etc. Vítimas de horrenda cirurgia a base de tijolos contemporâneos que arrancou sua armação de madeira e tapou sem escrúpulos sua liberdade de vê o que se passa na rua, o indispensável meio de comunicação com o exterior, que em determinado momento serviu de modelo a todo um contexto social de uma época, perdeu seu valor na medida em que o tempo foi passando e novas tendências chegaram para soterrar aquilo que um dia foi regra.
No século XXI, antigas construções resistem como plantas no sertão, lutando por uma água cada vez mais escassa que permitirá a sua sobrevivência. Ameaçadas pelo avanço do “ecletismo moderno” que elimina da cidade parte de sua memória para dar lugar um novo conceito de viver, as referências do passado quando muito, devem ficar preservadas apenas na fachada de algo que um dia fez parte de um conjunto arquitetônico. Não fosse a importância e o tamanho de construções como palácios, igrejas, casas legislativas e monumentos semelhantes aos da Associação Comercial que para derrubá-los daria trabalho e chamaria a atenção da opinião pública, nenhum resquício da arquitetura antiga existiria na capital alagoana.  Maceió é um bom exemplo de cidade modelo onde concreto e vidro domina a arquitetura local. Fotografias do Centro antigo despertam saudosismo em quem as contempla e busca encontrar na arquitetura daquele lugar construções que faziam parte das imagens em preto e branco congeladas pelas lentes dos fotógrafos.

A História da raça humana é permeada por uma dicotomia constante. O homem abandona com facilidade aquilo que um dia foi de grande importância para ele por algo novo, desconhecido que não muito longe tornará a deixar para trás. Seu fascínio em absorver novas idéias e conceitos, implica em soterrar e apagar da memória o que foi parte de sua vida. Por outro lado, nos deparamos com o trabalho da arqueologia que sai à procura de tudo aquilo que um dia foi produzido pelo homem ao longo de sua existência. Cavando, remexendo nas entranhas da terra e até mesmo do mar, os arqueólogos trazem a tona o passado que foi renegado ao esquecimento.
Teriam as portas e janelas ao longo do tempo esse encontro com os arqueólogos? Seriam tão importantes a ponto de serem jogadas em um buraco para serem soterradas? Não. Dificilmente elas teriam tamanha sorte, ao contrário das cerâmicas, talheres, cachimbos, armas antigas, utensílios domésticos. Destinadas a servir como barreira entre o exterior e o privado, proteção contra as mudanças do tempo para a habitação de seus senhores, portas e janelas de construções antigas têm o fim trágico, inglorioso ante a beleza que tiveram um dia enfeitando o caminho de transeuntes dos mais diversos lugares que passaram por elas. Se falassem, poderíamos ouvi-las contar suas histórias e talvez elas fossem recicladas.
Em tempos de remodelagem do Centro, onde a paisagem de um período sofreu uma lipo aspiração, em que árvores foram ceifadas e as fachadas das lojas se modernizaram na intenção de se assemelharem as concorrentes dos grandes shoppings, resta-nos ainda encontrar nesta paisagem recauchutada pedaços desse tempo em que as construções eram verdadeiras obras de arte. Se tivermos sorte, um dia, passando pelas ruas do centro, poderemos encontrar o letreiro faraônico de uma loja sendo trocado e ali, no local onde estava, descobrimos com um certo desgosto, as bandeirolas de uma porta antiga, de ferro vazado se não estiverem tampadas por tijolos. Rua do Comércio, do Livramento, da Boa Vista e tantas outras ainda escondem um remanescente destes artefatos, mas nada garante que elas sobreviverão por mais tempo sem que o interesse estético moderno dos proprietários desses imóveis esteja em harmonia com o lucro daquilo que negociam.
As portas e janelas antigas que testemunharam os acontecimentos do passado, no presente, para nada serve a sua subsistência. Até caírem com o tempo, o descaso será o seu destino.
Maceió, 07 de Dezembro de 2010.