quinta-feira, 17 de março de 2011

CARTA DO EXÍLIO

Sentado de costas para a vida
vejo o tempo passar sem pressa
tornando longa e ansiosa a espera de uma felicidade que não vem.
Sentado de costas para a vida,
penso na terra que deixei para trás,
no lugar onde morei, nos conhecidos e admiradores.
A alegria do exílio é falsa
e o sono das noites quentes e abafadas são pesadelos do inferno.
Sinto saudade do frio, da chuva que constantemente cai e refresca a alma...
Da garoa que banhava meu rosto como bálsamo.

Do tamanho da minha cidade é angustia que sinto neste exílio,
nada que acontece vem diminuir o meu tormento.
Meu corpo está em grilhões nesta terra rude,
inoportuna, onde poucos têm muito e muitos têm quase nada.
Meu pensamento voa em busca das paisagens urbanas do lugar onde morava,
mas aqui no exílio, nada vou encontrar igual.
Aqui tudo é limitado, simplista, comedido, atrasado.

Não sei até quando viverei sentado de costa para a vida neste exílio.
Desejo viver e aproveitar cada segundo da vida, ser feliz...
Ter liberdade para amar e ser amado,
por alguém que eu escolhi e que mora no
lugar de minha paixão onde tudo é imenso,
mas as oportunidades são inúmeras.
Até quando ficarei sentado de costas para a vida?

Maceió, verão de 2003

E o coqueiro também morreu

Quando falei da morte do pé de mamão nascido no quintal da nova casa, citei a sorte de um único coqueiro que vejo da porta da cozinha plantado no quintal de uma casa vizinha. Quando antes aqui não tinha sido feito a área de serviço, era possível vê-lo em toda sua beleza e o balançar de sua abundante folhagem e como ficava carregado em tão curto espaço de tempo. Na referida casa que era de aluguel não parava inquilinos e a cada novo morador que chegava víamos sempre alguém trepado no coqueiro ou tirando as folhas para os festejos juninos ou extraindo os frutos daquela planta. Do nosso primitivo quintal desprovido de um teto o coqueiro vizinho se projetava como a torre de uma catedral na imensidão do azul celeste. Com a cobertura feita pára proteger os entulhos da chuva restou uma pequena abertura no telhado que separava a casa da área de serviço e por esse filete de espaço o coqueiro alheio aparecia a nossa vista como uma figura colada naquele resto de espaço.

Nada nesta vida é para sempre e o mundo está repleto de pessoas inimigas da natureza. Derrubar, desmatar, poluir, camuflar são palavras que imperam em nosso atual contexto. Num desses primeiros dias de março, antes do carnaval o dia amanheceu nublado e quando acordei e fui á cozinha para tomar café e lá estava à cena que eu nunca imaginara. O coqueiro figurava como um poste no cinza daquela manhã chuvosa, desprovido por completo de sua folhagem e de seus frutos. Não sei se por falta das ferramentas apropriada ou por limites de espaço, o tronco da planta foi deixado em seu lugar ficando no espaço como referência de que ali um dia existiu um pé de coqueiro que segundo quem teve a oportunidade de beber de sua água, dizia ser muito doce.
Passado alguns dias vi na rua a cara de quem foram condizentes com aquele crime. Arrastavam as folhas com a cara de desconfiança como menino amarelo que comete traquinagem e depois tenta parecer o mais angelical possível.
O que restou daquela planta agora é a imagem que vejo toda vez que chego à porta da cozinha.

Maceió, 14 de março de 2011

A CURTA VIDA DE UM PÉ DE MAMÃO

No quintal da casa onde moro, faz dois anos, nasceu um pé de mamão e aventurou-se em crescer numa terra que nada tem de adubada e pior ainda, na casa dos meus queridos pais que são inimigos declarados da natureza. Tudo o que cresce mais de um metro e que não é planta ornamental eles mandam corta. Os dias desse mamãozeiro estavam contados. O dito quintal não é lá grande coisa, nada mais que um espaço para guardar entulhos: um tanque, uma caixa d’água, no chão, o lixeiro e um pedacinho de área não cimentada onde um mato galhofa teima vez por outra aparecer só para me dá trabalho de arrancá-lo com a mão como se eu não tivesse mais o que fazer. Pois bem, neste pedaço de terra onde despejamos gordura de panela, nasceu um dia, creio que foi antes do inverno, um pé de mamão e ao seu lado um de maracujá: ambos teriam vida curta.

O tempo foi passando e eles crescendo, mas de antemão eu já sabia que aquilo não iria muito longe. Na antiga casa acontecera coisa parecida e os inimigos da natureza trataram de aniquilar o invasor. Fico pensando comigo:, como pode existir pessoas no mundo que é insensível à natureza e sente ojeriza por uma árvore? Sonho um dia ter uma casa num lugar afastado, uma chácara, onde eu possa ter todo tipo de planta e viver cercado por elas.
O primeiro a ser liquidado foi o pé de maracujá infestado de lagartas. De um só golpe suas ramagens foram separadas do pé de mamão que cresceu ao seu lado. Bastou descobrir o sexo daquele pé de fruta: ele era macho, para a sentença ser anunciada. O mamãozeiro seria cortado. O inverno chegou e o fatídico dia parecia distante. Meu protesto em favor da vida da planta de nada adiantou. Defender o pé de mamão foi o mesmo que nada e todos os dias eu o via da altura de um poste inserido na figura tristes dos tijolos descobertos do quintal sem graça. Em dia de sol forte fazia sombra e a roupa que era estendida no emaranhado de varal mal ficava exposta ao sol: Aquele pé de mamão tinha mais era que desaparecer, estava no lugar errado.

Num desses dias em que a chuva do inverno deu trégua e o sol apareceu como se fosse verão, sentei junto dele para ler um texto e a sensação não poderia ser melhor. Os frutos que não tinha eram compensados por uma quantidade de flores que deixava escapar um cheiro agradável por todo o quintal. Todas as manhãs, na hora do café eu ficava contemplando o seu porte e a folhagem que se expandia como os tentáculos de um polvo. Nessa segunda, 22 de setembro de 2009, acordei com o barulho de uma obra aqui em casa. O quintal estava sendo preparado para a construção de uma área de serviço e o pé de mamão foi sacrificado. Quem o cortou tratou de levá-lo para longe dos meus olhos. Pela janela da cozinha, resta à visão de um grande pé de coqueiro plantado no quintal de duas casas à frente de onde moro. Sorte dele; se tivesse nascido aqui não teria sobrevivido por muito tempo mesmo sendo macho e dando frutos.

Maceió 22 de setembro de 2009