2012
Mais um ano que passa e quantas impressões adversas ficarão em nossa memória.
Dos votos de fartura, dinheiro no bolso, saúde para dar e vender, paz e prosperidade, talvez um pouquinho de cada coisa tenha chegado ao lar de milhares de pessoas que elegerá o quase findo ano como “bom” afinal, o sol nasce para todos, mas as tragédias que pontuam a nossa existência se apresentam em tamanho e formato diferenciado.
2012 e quanta coisa foi comemorada nesse ano rememorando datas que a cem anos atrás entraram para a história da cidade de Maceió como acontecimento que marcaram de forma trágica a vida daqueles que aqui residiam.
Panorâmica do centro de Maceió com destaque para a Praça dos Martírios e o antigo Palácio do Governo em 1912
Recordações do passado que contemplaram datas com um significado maior dentro do contexto urbano da cidade e que de uma forma direta ou não afetara o cotidiano da população local, mas que deixou fora significativo registro de anônimos que fizeram parte daquele momento e que presenciaram o acontecimento de outro ângulo.
Passa-se o tempo e com ele novas tecnologias chegam para sanar os problemas causados pelo próprio homem, mas particularidades características de nossa existência continuam a mesmas desde sempre: diferenças de classe, a luta pela sobrevivência, a busca pela felicidade, conforto e segurança fizeram parte dos anseios daqueles que passearam pelas ruas desta cidade, circulando a pé ou conduzindo uma carroça.
Usuários de pequenos barcos que se aventuraram por águas de lagoas nas áreas afastadas do centro e para chegar a Maceió tendo ainda de sair ao encalço de um bonde que a mercê das intempéries do tempo os conduzirá ao local desejado na parte central da cidade. Em doze meses, tantos acontecimentos pautaram a passagem do ano que nasceu novo e que dependendo da tragédia trazida por ele logo o tornamos ‘velho’, desejando “que o tempo passe correndo”.
Em uma região onde sol e chuva dividem em dois as estações do ano, a vida na cidade de Maceió é semelhante a do campo aonde o período chuvoso chega trazendo fartura e abundância de água enquanto o sol proporciona a oportunidade de boa colheita e facilidade de locomoção sem a incômoda presença da lama, apesar do calor. Entre todas as mudanças partilhadas ao longo do ano no histórico da cidade sol e chuva figuram como um verniz fixando na memória em como estava o tempo no dia em que aquele fato aconteceu.
Com a aproximação do verão no último mês do ano, registramos entre os nativos da terra a constante presença de turistas que chegam de diferentes lugares para desfrutar das belezas naturais do Estado e, de passagem, alguns desvinculados da orientação dos guias turísticos, descobrem aqui e ali que a bela cidade onde aportaram possui uma arquitetura primitiva que remete a história de sua formação.
Com encanto e desencanto descobrem que no interior da’ ilha’ existe um conjunto arquitetônico que pode ser apreciado e visitado, ainda que em alguns casos os descompassos na preservação deixe a desejar. Foi agora, em fins do mês de novembro que ao me dirigir ao prédio da Associação Comercial para pegar alguns exemplares desse jornal ali chegando presenciei com surpresa uma exposição de arte que tomava toda área do primeiro piso.
Fachada Principal do prédio da Associação na rua Sá e Albuquerque
Detalhe da porta principal
Na saída, enquanto assinava o livro de visita um oficial do corpo médico de um transatlântico ancorado no cais chegou ao recinto e me pediu explicação sobre aquela exposição. O navio trazia argentinos e as dezesseis horas deixaria Maceió.
Argumentei com ele que todos os anos, sempre nessa temporada de verão era surpreendido com a visão daquelas embarcações colossais que vista do alto da ladeira da Catedral parecia estar paradas bem ali na praça Sinimbu e na ânsia de presenciar tão belo navio descobrimos que ele se encontra distante a medida em que nos aproximamos da praia. Vá vê-lo de perto, disse ele crente de que isso era possível. Não é possível, argumentei; a burocracia administrativa do porto não permite o acesso dos nativos que não sejam credenciados por ela.
Saindo da Associação Comercial segui em direção do Museu da Imagem e do Som e ainda na escadaria do prédio uma turma de concluintes agrupados nos degraus se arrumavam para mais uma daquelas fotos de formatura misturados a um grupo de turistas que chegavam para olhar a cidade no pouco tempo que tinham antes de deixarem o porto.
Um bom número deles estava a pé, em grupo de seis a dez e vê-los desengonçados com o desconhecimento do local e da quantidade de informação arquitetônica da Rua Sá e Albuquerque era algo que despertava o desejo de me oferecer para orientá-los, o que terminou por acontecer mais adiante quando fui consultado por outro grupo que queria saber em que direção ficava a praia, nesse caso a de Pajuçara próximo a Praça Manoel Duarte. Onde estaria os guias turísticos e porque tão numeroso grupo foi liberado para passear pela cidade com tanta liberdade?
Fachada do antigo Banco de Londres na Sá e Albuquerque, Jaraguá
Mas a cena que me chamou a atenção foi a de um grupo parado na calçada a frente de um banco olhando e fotografando o esqueleto do antigo Banco de Londres. Nos segundos em que circulei por entre eles para chegar a outra extremidade da rua e no pouco que pude entender as perguntas eram: O que teria sido aquele prédio? Porque ficara assim deslocado na paisagem do antigo bairro portuário como exemplar espoliado de uma guerra? Câmeras potentes estavam apontadas para o alto desse edifício captando os mínimos detalhes que o olhar estrangeiro desabituado aquela paisagem enxergam tão bem. A paixão por uma cidade sempre nasce e cresce por intermédio de uma imagem feita por um desconhecido e que as circunstâncias se ocupou em nos apresentar.
Esse será mais um verão entre tantos outros que ainda estão por vir e quando os navios se forem e a temporada acabar a chuva chegará para mudar a paisagem e renovar as energias que foram ressecadas pelo calor do sol e a cidade continuará com suas transformações que por curto espaço de tempo nos deixa surpresos diante do algo novo; mas logo nos habituamos ao cheiro do novo e passamos a desconsiderar o antigo como sendo fora do contexto fadado a desaparecer para dar espaço a remodelação necessária tão bem imposta a sociedade em nome da modernidade.
Texto publicado no Jornal O Palácio, Nº 22 em Novembro de 2012